sexta-feira, 21 de março de 2014

Seleção de zebras é bicampeã


                                  “Seleção de zebras” é bicampeã

                                                                                    

Formada por jogadores de cinco clubes chamados pequenos, a seleção brasileira conquistou o II Campeonato Sul-americano da Divisão de Acesso, em Buenos Aires. Denoni, ex-jogador do América e da Portuguesa, em janeiro de 1964, na qualidade de técnico do São Cristóvão, assumiu o comando do selecionado brasileiro e convocou jogadores do Canto do Rio, Madureira, Olaria, Portuguesa e São Cristóvão.


Denoni iniciou sua carreira de treinador na lusa carioca e, depois de completar o curso de técnico na Escola de Educação Física, ingressou no clube de Figueira de Melo, como auxiliar de Danilo Alvim. Em 1963, com a saída de Danilo, foi efetivado no cargo de técnico do elenco são-cristovense.


Sem atletas de outros estados, a seleção brasileira partiu para a Argentina, desacreditada. A união do grupo aliada a garra demonstrada nos jogos contra paraguaios, peruanos, uruguaios e argentinos foram determinantes na grande e emocionante conquista do título. Acompanhamos de perto o trabalho do competente Denoni, o firme comando dos dirigentes Abraim Tebet e Ulmar Hargreaves, a dedicação do Dr. Hilton Gosling e do massagista KO Jack e a fibra dos jogadores.

Transmitimos todas as partidas do Brasil pelo microfone da Emissora Continental, através das ondas curtas da Rádio Splendid, de Buenos Aires. Naquela época, não existia Embratel. Aguardávamos ansiosos, no dia seguinte, o telegrama dos companheiros para saber se a transmissão do jogo chegara bem. Felizmente, a mensagem sempre foi à mesma: “Ótima transmissão”. Era um alívio. Como viajamos sem comentarista, fomos orientados por Carlos Marcondes, Chefe do Departamento de Esportes da Continental, a convidar o querido e saudoso amigo Oldemário Touguinhó, que cobria o campeonato para o Jornal do Brasil, para fazer os comentários. Sábia sugestão do Marcondes. Conhecemos de perto a grandeza humana e a capacidade profissional do inesquecível companheiro. Touguinhó nos ajudou muito, especialmente, em razão da nossa inexperiência. Tínhamos apenas dez meses de narração esportiva. Quando regressamos, para nossa alegria, soubemos que o querido e saudoso Milton Sales, na sua seção “Som e Imagem”, no Jornal dos Sports, havia nos premiado como revelação do rádio esportivo.  

O Brasil estreou vencendo o Peru por 1 a 0. O segundo adversário foi o Paraguai e nova vitória pelo magro placar de 1 a 0. Diante do Uruguai, a seleção brasileira realizou bela partida e triunfou por 4 a 1. Restavam os argentinos também invictos. Jogo duro que terminou com a igualdade no marcador de 1 a 1.

No dia 2 de fevereiro de 1964, o estádio do Huracan recebeu grande número de torcedores para assistir o jogo extra que apontaria o campeão do sul-americano de acesso. Beneficiado pelo “goal-average”, os brasileiros jogavam com a vantagem do empate.

A partida começou nervosa com os argentinos jogando duro O árbitro peruano Alberto Tejada fechava os olhos para a deslealdade praticada pela seleção argentina. Aos 15 minutos, o ponteiro esquerdo Más abriu a contagem.

O primeiro tempo terminou com o placar de 1 a 0. O resultado dava o título à Argentina. No 2o tempo, à disposição dos jogadores brasileiros fez com que a partida se tornasse emocionante. Nosso drama aumentava a cada minuto e o gol brasileiro não saía. Faltava um minuto para terminar o jogo, quando Uriel, ponta direita do Canto do Rio, nos proporcionou a maior emoção da nossa carreira de narrador esportivo. Gol do Brasil! O título é nosso. Nossa vibração foi tão grande que o brilhante jornalista Armando Nogueira, na sua coluna “Na grande área”, no Jornal do Brasil, escreveu:

 “O locutor que irradiava o jogo, acho que era o José Rezende, soltou um grito impressionante, o homem entrou em crise, não se entendia nada do que ele dizia, de forma que acabei sem saber como foi marcado o gol de Uriel – se de cabeça, de bico de chuteira, ou de canela. Só sei é que naquele berro alucinante a modesta seleção de acesso da Guanabara estava conquistando o bicampeonato sul-americano da categoria. Como já disse, eu uma vez, o título não chega a envaidecer a CBD que, a rigor, até a última hora, esteve contra a participação do Brasil no campeonato. Compreende-se que a CBD não se preocupe com esses compromissos menores, pois, a essa altura, ela já se sente, orgulhosamente, um cabide de grandes glórias esportivas internacionais. Portanto, oficialmente, o gol de Uriel e o grito do locutor não repercutirão nos gabinetes do QG do futebol. Mas, já pensaram vocês na significação desse título, por exemplo, para a modesta carreira do zagueiro Casemiro? Haverá alguém, hoje, mais feliz que o nosso humilde Uriel?

Pela voz do locutor, a gente pode fazer uma ideia do entusiasmo com que os nossos jogadores arrancaram o empate e, consequentemente, o título de campeões, domingo, no campo hostil de Buenos Aires. O melhor exemplo de toda a dedicação da equipe está no procedimento do meia Fefeu. Passara a semana inteira com febre, amargando uma gripe violenta. Assim mesmo, foi escalado e, embora doente, correu uma barbaridade. Extenuado pelo esforço brutal, acabou Fefeu tendo que sair. Mas, em vez de se recolher ao vestiário para cuidar da saúde, ficou ali na pista, torcendo, como um louco, estimulando o time, ardendo em febre (um profeta com o gosto do estilo diria que era a febre da vitória) até o derradeiro minuto, aquele delicioso minuto em que Uriel empatou o jogo chutando a bola, digamos, com os pés de toda a sua equipe, pois a verdade é que era tal a determinação de vitória dos onze, que aquele gol foi à obra acabada de um chute coletivo em que Uriel entrou com o gesto e os demais jogadores com a força superior da fé que costuma ser a arma invencível dos humildes.

Acho uma beleza quando um time desacreditado, feito em cima do laço, consegue chegar ao sucesso, assim, dramática, porém limpamente, como ocorreu, domingo, com a seleção nacional da divisão de acesso, ou, para maior justiça, a seleção canarinho  do Brasil – do Brasil de Ari, Renato, Nésio e Casemiro.”

O Brasil venceu com: Franz (depois Ari); Ari, Renato, Nésio e Casemiro; Valtinho e Jair (Zé Carlos) (Elton); Uriel, Fefeu, Luís Carlos e Ivo.

 

 Seleção brasileira de acesso antes de um treino, em Figueira de Melo: em pé, Dr. Hilton Gosling, Ari (Madureira), Renato (S. Cristóvão), Valtinho (Olaria), Ari (S. Cristóvão), Elton (S. Cristóvão), Nésio (Canto do Rio), Fefeu (Canto do Rio), Franz (S. Cristóvão), Casemiro (Olaria) e o técnico Denoni (S. Cristóvão); sentados, Nocaute Jack (massagista), Uriel (Canto do Rio), Zé Carlos (Portuguesa), Batata (Madureira), Ivo (S. Cristóvão), Zezinho (Portuguesa), Luiz Carlos (Olaria), Jair (S. Cristóvão) e Enir (S. Cristóvão).
                      A defesa da seleção com Ari, Franz, Renato, Valtinho, Nésio e Casemiro

                        Linha atacante da seleção com Uriel, Zezinho, Luiz Carlos, Jair e Enir.

O técnico Denoni com o Dr. Hilton Gosling

Adeus ao eterno capitão


                                                   Adeus ao eterno capitão
O garoto Hideraldo Luís Belini desde cedo revelou seu temperamento de líder nato. Era o organizador das brincadeiras e principalmente das peladas, em Itabira, interior de São Paulo, sua terra natal. Os primeiros chutes foram dados nas bolas feitas de meia por ele e seus colegas, no gramado em frente à Igreja de Santo Antônio, matriz da cidade.
O começo no interior de São Paulo
A garotada queria algo mais além das peladas e pensaram em fundar um time organizado com uniforme e tudo mais. Assim surgiu o Juvenil Paulistano, cuja camisa branca e vermelha com listras verticais lembrava a do Bangu.
Com 17 anos, Belini vestiu a camisa da Sociedade Esportiva Itapirense. Ali iniciava a sua trajetória de zagueiro. Depois defendeu por dois anos, de 49 a 51, o Sanjoanense, de São João da Boa Vista, clube da 2ª divisão de São Paulo.
Não agradou ao presidente, mas o técnico gostou
Um olheiro do Vasco o indicou ao presidente Otávio Póvoa, que o contratou. Seu futebol não agradava muito a Ciro Aranha, novo presidente do clube. Porém, Flávio Costa gostou do seu modo de jogar: firme, com personalidade e leal. Flávio não se cansava de orientá-lo nos treinos: “Rebata de primeira.”
Inicialmente, Belini ficou na reserva de Augusto, mas em pouco tempo passou a formar o trio final vascaíno com Barbosa e Paulinho de Almeida. Vieram os títulos do Torneio Octogonal Internacional de 1953, as conquistas do campeonato carioca de 56 e do Torneio Rio-São Paulo de 58. Sua liderança e seu estilo sério de atuar começaram a despertar a atenção da Comissão Técnica da seleção brasileira.
A primeira convocação para a seleção
Osvaldo Brandão o convocou para as eliminatórias da Copa do Mundo de 58. A estréia foi contra o Peru, em Lima, no empate de 1 a 1. Vicente Feola substituiu Brandão e definiu a condição de Belini como titular do selecionado brasileiro. Seguiram-se os amistosos contra Portugal (2 a 1 e 3 a 0), jogos da Copa Roca diante dos argentinos (1 a 2 e 2 a 0), as partidas com os paraguaios pela Taça Osvaldo Cruz (5 a 1 e 0 a 0) e os jogos contra a Fiorentina (4 a 0) e a Internazionale (4 a 0), na Itália.
O capitão que ninguém esquece
Como capitão brasileiro Belini atuou em todos os jogos do mundial. Após a partida decisiva contra a Suécia, ergueu a Taça Jules Rimet, criando o consagrado gesto imitado por todos os capitães da seleção brasileira: Mauro, em 62, no Chile; Carlos Alberto, em 70, no México; Dunga, em 94, nos Estados Unidos; e Cafu, em 2002, no Japão.
Ao retornar da Suécia, Belini conquistou o supersuper carioca de 58. No início de 59, em Buenos Aires, Belini disputou o sul-americano em que o Brasil terminou invicto em 2º lugar. Em 1962, no mundial do Chile, sob o comando técnico de Aymoré Moreira, perdeu a posição para o são-paulino Mauro.   
No ano seguinte, deixou o Vasco, transferindo-se para o São Paulo. Vicente Feola o convocou novamente para defender o selecionado brasileiro e Belini disputou o mundial de 66, na Inglaterra. Jogou diante da Hungria (1 a 3) e de Portugal (1 a 3).
Em 1968, com 39 anos, seguiu para Curitiba, onde um ano depois encerrou a carreira no Atlético Paranaense, na partida entre seu clube e o Coritiba, o famoso clássico Atletiba.
Foi marcante na sua carreira a liderança exercida sobre os companheiros. O goleiro Humberto Torgado, seu colega de Vasco, uma vez me disse:
“Rezende, você não tem idéia do respeito que os jogadores tinham pelo Belini. Ele entrava no vestiário, vestia sempre a camisa de frente para a parede e quando se voltava para o grupo, todos nós sentíamos que ali estava o capitão, o nosso líder.”
O nosso eterno capitão nos deixou no dia 20 de março de 2014, aos 83 nos. A disciplina, a dedicação e a eficiência marcaram a trajetória de Belini no futebol. Sua liderança nunca foi contestada por seus companheiros de profissão.

Belini abraça o técnico Gradim após conquistar o título de supersupercampeão carioca em 1958

Em 1958, no jogo Vasco e Fluminense, Belini marca Escurinho


                   Belini, Barbosa e Paulinho, Eles formaram o trio final na temporada de 1958
Belini lidera a volta olímpica dos campeões mundiais de 1958

Na partida decisiva com o Flamengo em 1958, Belini e o atacante Dida

No triangular decisivo do carioca de 1958, Belini disputa a bola com Quarentinha 

                                  Belini recebe a faixa de supersupercampeão carioca de 1958

Hilgton Gosling, Belini e Nilton Santos, em Buenos Aires, durante o sul americano de 1959

      Belini e garrincha retornam a seleção brasileira nos preparativos para a Copa de 1966
                                      Belini cumprimenta o capitão búlgaro na Copa de 1966

                                      Em 1963, Belini se transferiu do Vasco para o São Paulo

Belini encerrou a carreira no Atlético Paranaense em 1969

Belini tinha um grande carinho por Almir. Ele batizou o amigo.