A derrota do já ganhou - II
A ausência da
Argentina possibilitou a classificação automática da Bolívia e do Chile.
Equador e Peru, solidários aos argentinos, deixaram o caminho livre para o
Uruguai. Alguns países europeus e asiáticos (Escócia, França, Turquia) também
desistiram, reduzindo para treze o número de participantes.
Assim, os grupos
formados não tiveram o mesmo número de seleções: grupo I – Brasil, Iugoslávia,
México e Suíça; grupo II – Inglaterra, Chile, Espanha e Estados Unidos; grupo
III – Itália, Paraguai e Suécia; e grupo IV – Uruguai e Bolívia.
O primeiro
colocado de cada grupo se classificou para o quadrangular decisivo, no qual os
participantes se enfrentaram, valendo os pontos corridos.
Na primeira
fase, os adversários do Brasil foram o México, a Suíça e a Iugoslávia. No dia
24 de junho de 1950, o Maracanã recebeu 81 649 expectadores que assistiram a
estréia do Brasil contra o México. Vencemos por 4 a 0 com gols de Ademir (2),
Jair e Baltazar.
Enfrentamos os
mexicanos com Barbosa, Augusto e Juvenal, Eli, Danilo e Bigode; Maneca, Ademir,
Baltazar, Jair e Friaça.
Os torcedores
paulistas assistiram a segunda apresentação da seleção brasileira. No dia 28 de
junho, o Brasil jogou contra a Suíça, no Pacaembu. Flávio Costa escalou Rui e
Noronha, respectivamente, nos lugares de Eli e Bigode, colocando em campo a
intermediária do São Paulo. No ataque, saiu Jair entrando Alfredo na
ponta-direita com Maneca sendo deslocado para a meia-esquerda.
Alfredo abriu o
placar aos 3 minutos, Fatton empatou aos 17 e Baltazar fez o nosso segundo gol
aos 32. Faltavam dois minutos para terminar o jogo e Fatton novamente balançou
a rede de Barbosa.
O Brasil jogou
com Barbosa, Augusto e Juvenal; Rui, Bauer e Noronha; Alfredo, Ademir,
Baltazar, Maneca e Friaça.
O time não
rendeu o esperado e o empate de 2 a 2 trouxe certa preocupação, porque com as
duas vitórias da Iugoslávia (Suíça 3 a 0 e México 4 a 1), ficamos com a
obrigação de vencê-la no jogo seguinte, para garantirmos nossa participação no
quadrangular final.
Na decisiva
partida diante da Iugoslávia, Flávio Costa apelou para Zizinho jogar, mesmo sem
condições físicas ideais. Danilo, Bigode e Jair voltaram à equipe e Chico
ocupou a ponta-esquerda.
Brasil e
Iugoslávia realizaram o melhor jogo da Copa. Jogamos muito bem e vencemos o
excelente time iugoslavo por 2 a 0, gols de Ademir, aos 4 minutos, e Zizinho
aos 24’ do 2o tempo.
A equipe que
conseguiu a classificação atuou com: Barbosa, Augusto e Juvenal; Bauer, Danilo
e Bigode; Maneca, Zizinho, Ademir, Jair e Chico.
Suécia, Espanha
e Uruguai se classificaram nos demais grupos. Os uruguaios, na sua chave,
devido à desistência de outros países, enfrentaram apenas a Bolívia. Os
bolivianos foram goleados por 8 a 0, no Estádio Independência, em Belo
Horizonte.
O regulamento
estabelecia que a fase final da Copa fosse disputada pelas seleções
classificadas em um quadrangular. Flávio Costa escolheu a ordem dos jogos do
Brasil: Suécia, Espanha e Uruguai.
Na reunião com a
imprensa esportiva para explicar o critério da escolha, o querido e saudoso
Jornalista e Locutor Esportivo Luiz Mendes, posteriormente, o “Comentarista da
Palavra Fácil”, alertou o técnico:
“Eu analisava a
coisa com isenção. Era o mais jovem dos locutores esportivos nessa ocasião. A
CBD, presidida pelo Dr. Mário Polo, que substituía o titular Dr Rivadávia
Correia que estava doente, nos reuniu com o Flávio Costa, técnico da seleção,
para explicar sobre o quadrangular final.
O Flávio havia
escolhido a ordem dos jogos: o primeiro contra a Suécia; o segundo contra a
Espanha; e o terceiro contra o Uruguai. Éramos uns vinte cronistas na CBD e o
Dr. Mário Polo perguntou se alguém tinha alguma contestação a fazer. Eu, então,
levantei o braço e disse que seria melhor colocar o Uruguai como primeiro
adversário, porque os uruguaios numa decisão são perigosos pelo espírito deles.
“Isso é gauchada
sua”, disse o Fernando Bruce, um dos cronistas, que era do “Jornal da Noite” e
do “O Jornal”. Eu respondi que não era gauchada e sim porque morei muitos anos
no Rio Grande do Sul e sabia como eram os times uruguaios, que jogavam frequentemente
no Rio Grande. Acrescentei, lembrando que há um mês disputamos a Copa Rio
Branco com eles, perdendo em São Paulo por 4 a 3 e vencendo no Rio de Janeiro
pela diferença apenas de um gol: 3 a 2 e 1 a 0. Acharam que eu não tinha razão.
Eu não achava que eram favas contadas, como se diz.”
Arrasamos a
Suécia e a Espanha. No dia 9 de julho, os suecos foram goleados por 7 a 1
perante 138 886 pagantes. Ademir abriu a contagem aos 17’, fez o segundo aos
36’ e marcou o terceiro aos 39 minutos; no segundo tempo, Ademir fez mais dois,
aos 7’ e aos 13’; o sueco Andersson assinalou de pênalti aos 22’, Maneca foi o
autor do sexto gol aos 40’; e Chico encerrou o marcador aos 43 minutos.
Quatro dias
depois, arrasamos os espanhóis por 6 a 1 perante 152 772 torcedores, cantando
Touradas de Madri do grande compositor Braguinha. Fizemos 3 a 0 no primeiro
tempo: Ademir aos 15’, Jair aos 21’ e Chico aos 31 minutos. Chico fez o quarto
gol aos 10 minutos do segundo tempo, Ademir dois minutos depois marcou o quinto
e Zizinho assinalou o sexto gol brasileiro aos 22 minutos. O gol de honra
espanhol foi marcado por Igoa aos 26’.
A única mudança
na equipe em relação ao jogo anterior diante dos suecos foi a saída de Maneca,
por contusão, substituído por Friaça.
Luiz Mendes nos
falou sobre outros motivos que o faziam sentir as dificuldades a serem
enfrentadas contra o Uruguai:
“Eu era amigo do
Ondino Viera, que foi o maior técnico por aí. Melhor do que Flávio Costa, Zezé
Moreira e outros. Ondino era uruguaio, estava no Bangu e tinha sido campeão no
Vasco, no Fluminense. Só não foi no Botafogo, porque tinha o Heleno de Freitas.
Foi ele que aconselhou o Botafogo a vender o Heleno, se não nunca seria
campeão. Vendeu e no mesmo ano foi campeão.
Ondino estava
ligado aos patrícios dele. Ele morava perto do Hotel Paysandu, onde estava
concentrada a seleção uruguaia. Ele ia lá, conversava, instruía, porque
conhecia todos os jogadores da seleção brasileira e quase todos haviam jogado
com ele. No Fluminense, Bigode havia jogado com ele; tinha sido técnico do
Vasco com Jair, Ademir, Augusto, Chico, todo mundo. Eu tinha medo do Uruguai,
por causa dele.
Os jornais
saíram no dia do jogo com a manchete: “Brasil campeão do mundo”. Eu tinha esse
jornal aqui em casa, mas me roubaram. A Noite Ilustrada com o time brasileiro
em fila indiana com o título: “Brasil campeão do mundo”.
Parte dos 173
850 expectadores, consta que foram 200 000, começou a chegar ao Maracanã antes
do meio-dia daquela tarde de 16 de julho de 1950. Ninguém admitia a derrota.
Todos tinham a certeza de que o Brasil estava a poucas horas de se sagrar
campeão mundial.
O primeiro tempo terminou empatado
de 0 a 0. Aos sete minutos da etapa final a torcida brasileira vibrou com o gol
de Friaça: Brasil 1 a 0. O título estava bem mais próximo, já que o empate
seria suficiente.
Luiz Mendes
narrou a partida pela Rádio Globo e nos contou o andamento do jogo após o gol
brasileiro:
“No jogo, para
surpresa geral o Uruguai empata. Nós éramos campeões com o empate e não nos
afobamos. Mas, a sete minutos do fim, o Uruguai faz o gol da vitória. O lance
era repetido. O primeiro gol uruguaio foi praticamente o vídeo tape do segundo.
Só que o segundo eliminou o centro para trás com Schiafino entrando e tocando
para dentro.
No segundo, a jogada se repetiu. O Bigode foi
batido, o Gighia chegou ao mesmo lugar, levantou a cabeça e o Barbosa, que
estava junto à trave fechando o ângulo, pensou que ele fosse repetir a jogada
anterior. Deu um passo para a direita e nesse momento Gighia deu o chute meio
de bico e a bola entrou entre a perna esquerda do Barbosa, que estava indo para
a direita, e o poste.
Eu descrevi o
lance normalmente, como todos os locutores esportivos e disse: “Gol do
Uruguai”. Aí senti que o Brasil estava perdendo a Copa do Mundo e me perguntei:
“Gol do Uruguai?” E, respondi: “Gol do Uruguai, senhores. Gol do Uruguai”.
Foram nove
inflexões diferentes, como comprova a gravação que foi posta no programa “Na
grande área”, do Armando Nogueira. Quem tinha essa gravação era o Gerson
Sabino, cronista esportivo mineiro, que possuía uma coleção maravilhosa de
vídeos e áudios sobre transmissões esportivas. O Sabino compareceu a todas as
Copas do Mundo, menos a de 98, porque faleceu antes. Eu tenho essa gravação
porque o Armando Nogueira me mandou.
Eu gritei o gol
normalmente. Mas diante daquele silêncio impressionante, senti que estávamos
perdendo a Copa Mundo. Foi quando eu me
perguntei: “Gol do Uruguai? Gol do Uruguai, senhores. Gol do Uruguai... Vejam
só. Gol do Uruguai... E, assim, eu fui até a nona inflexão diferente. A
decepção em cada uma delas retratada.
O estádio ficou
num silêncio mortal, uma coisa impressionante. Dava-se para ouvir a vibração do
Obdúlio Varela, dos jogadores uruguaios festejando o título no centro do campo.
Depois numa crônica que escrevi sobre esse fato eu coloquei: foi a única vez em
que se pode ouvir o silêncio.
No Rio de
Janeiro, dois, três dias depois a gente andava na Avenida Rio Branco e só se
ouvia as buzinas, os motores dos lotações, dos carros, dos bondes que
circulavam na Galeria Cruzeiro, onde hoje é o edifício Avenida Central. Vozes
humanas você não ouvia, todo mundo andava em silêncio.
Eu não culpo o
Barbosa, nem o Juvenal, nem o Bigode. O Uruguai foi melhor e ganhou. O Zizinho
diz isso, acrescentando que eles tinham um grande time.”
Os gols uruguaios foram marcados
por Schiafino aos 21 minutos e Gighia fez o do título aos 34. O Brasil
enfrentou o Uruguai com: Barbosa, Augusto e Juvenal; Bauer, Danilo e Bigode;
Friaça, Zizinho, Ademir, Jair e Chico.
O Uruguai no quadrangular final
empatou com a Espanha de 2 a 2 e venceu a Suécia por 3 a 2.
Foto 01
Foto 02
Foto 03
Foto 04
Foto 05
Foto 06
Foto 07
Foto 08
Foto 09
Foto 10
F 01 - Ademir abre a contagem
contra o México na estréia do Brasil na Copa de 1950.
F 02 - Baltazar ampliou o marcador
para 3 a 0.
F 03 - Ademir abre o placar diante
dos iugoslavos.
F04 - O ataque brasileiro perdeu
boas oportunidades e em alguns momentos Flávio Costa demonstrou preocupação ao
lado do Dr. Paes Barreto. O Brasil vencia por 1 a 0.
F05 - Torcedores descem a rampa do
Maracanã, festejando a vitória e a classificação para o quadrangular final.
Brasil e Iugoslávia realizaram o melhor jogo do mundial.
F 06 - Ramallete neutraliza a
investida de Chico na goleada sobre a Espanha.
F
07 - Friaça abre a contagem contra o Uruguai, aumentando a confiança da torcida
brasileira na conquista do título mundial.
F
08 - Chico também perdeu boas oportunidades. Essa Máspoli defendeu.
F 09 - Danilo Alvim era a expressão da derrota brasileira.
F 10 – Mestre Ziza, eleito o melhor
jogador da Copa, é consolado por Máspoli após a partida.