sexta-feira, 25 de outubro de 2013

85 anos do "Gênio da folha seca"


                                85 anos do “Gênio da folha seca”


            Escrito pelo querido amigo e brilhante jornalista Péris Ribeiro, com prefácio do grande João Máximo, e editado pela Gryphus, a biografia do mestre Didi, sob o título de o “Gênio da folha seca”, é leitura obrigatória para os amantes do futebol.

            Aqui no Álbum dos Esportes”, lembramos o “Gênio da folha seca” na passagem de seus 85 anos completados, agora no céu, no dia 8 de outubro de 2013. 

Sebo de carneiro, a santa receita da vovó

O garoto campista Waldir Pereira, com oito anos, iniciou o contato com a bola no time do comerciante Manoel Tamanqueiro. As peladas eram sua maior diversão. Numa delas, aos treze anos, machucou seriamente o joelho esquerdo e teve que andar de muletas por um bom tempo. O diagnóstico era de que a sua perna ficaria dura para sempre. A avó passou a cuidar do neto. Aplicava sobre a perna machucada sebo aquecido de carneiro, remédio caseiro, que trouxe bons resultados. A inatividade atrofiou um pouco a perna esquerda e a encurtou alguns centímetros.

A infância e o início da carreira profissional

Didi relembrou alguns fatos que marcaram esse período da sua infância:
 
“De muletas e depois de cadeiras de rodas era um espectador. Era um menino triste, mas nunca perdi a esperança. Minha avó passava sebo de carneiro aquecido no meu joelho. Pouco a pouco fui melhorando e, ainda, meio capenga voltei a jogar futebol”.
 
Recuperado, Didi passou a defender às cores do Industrial F.C. até chegar aos 17 anos, quando iniciou a sua vida de jogador profissional:

“Vesti a camisa do Rio Branco, de Campos, no campeonato da cidade. Recebi uma carteira de motorista profissional e mil cruzeiros mensais. 

Convidado, pelo clube local, fui jogar em Lençóis, no interior paulista. Lá fiquei oito meses e depois retornei ao Rio Branco.

O Madureira no seu caminho 

Meu descobridor, na realidade, foi Benedito Rosa. Ele observava e levava jogadores para times cariocas. Benedito foi a Campos observar alguns jogadores e os dois que o interessavam não aceitaram vir para o Rio. Benedito, então, convidou o Sula, Dodô, meu irmão, e a mim para fazer experiência no Madureira.

Viajamos dois dias e duas noites de trem, sem dormir, até Araraquara, onde estava a delegação do Madureira. Jogamos no dia seguinte e Sula e Dodô entraram desde o início da partida. Eu entrei no segundo tempo e nunca mais saí do time. O técnico era o Plácido Monsores”.

O Madureira, inicialmente, não aceitou a proposta de 5 mil cruzeiros de luvas e 800 cruzeiros mensais pedida por Didi. Diante da negativa, ele pegou as malas e rumou para estação, a fim de voltar para Campos. Esperava o trem, quando um diretor do clube suburbano apareceu e lhe informou que a proposta estava aceita.

No seu time e nas equipes adversárias, Didi encontrou jogadores que eram seus ídolos. No Madureira, jogava ao lado de Bitum, Arati, Godofredo e nos outros times enfrentava Zizinho, Danilo, Ademir, Maneca.

O gol histórico na inauguração do Maracanã

As atuações de Didi chamaram à atenção dos grandes clubes cariocas. Em 1949, ia ser vendido para o Vasco da Gama, porém os diretores do Fluminense tomaram à frente e viajaram para São Lourenço, onde se encontrava Aniceto Moscoso, presidente do Madureira. Aceita a proposta tricolor, Didi passou a ser jogador do Fluminense. No novo clube, o futebol de Didi cresceu e ele adquiriu a estabilidade profissional:

“Era o ano de 1949, quando passei a vestir a camisa, também, tricolor do Fluminense. No campeonato carioca fomos vice-campeões. No ano seguinte, na inauguração do Maracanã, jogando pela seleção carioca de novos contra os paulistas marquei o primeiro gol no grande estádio.
 
Didi estreou no Fluminense na partida diante do Arsenal, em São Januário, entrando no 2º tempo no lugar de Orlando. O tricolor carioca perdeu por 5 a 1.

Alegrias e tristezas

Em 1951, conquistei o primeiro campeonato carioca na minha carreira. Em meio à alegria, a tristeza de ter quebrado a perna do Mendonça, na primeira partida decisiva contra o Bangu. Fui acusado de criminoso, desleal e muito mais. Foi um momento muito difícil.

Sofri duas grandes decepções nos dois anos seguintes. As perdas do sul-americano, em Lima, e do mundial, em 54, na Suíça. Com relação à Copa do Mundo fui acusado de mercenário e de não ter garra”.

A inauguração do Maracanã tornou-se o maior acontecimento do futebol brasileiro. A partida inaugural, no dia 18 de junho, reuniria as seleções de novos do Rio e de São Paulo. Na lista dos convocados para a seleção carioca estava o nome de Didi. Os paulistas venceram por 3 a 1, mas o nome de Didi ficou para a história do grande palco esportivo, porque ele abriu a contagem, marcando o primeiro gol da história do gigante de cimento armando, um dos orgulhos da engenharia brasileira.

Campeão carioca pelo Fluminense, em 1951, Didi foi convocado pela primeira vez para a seleção brasileira por Zezé Moreira, seu técnico no Fluminense. Em Santiago, do Chile, Didi participou da conquista do primeiro título do selecionado principal brasileiro no exterior: 

“Estreei no jogo contra o México. Formei a linha atacante com Julinho, Baltazar, Ademir e Rodrigues. Fomos campeões, no Chile, conquistando o primeiro título no exterior”.

No mesmo ano, em que foi campeão pan-americano, Didi se sagrou, com o Fluminense, vencedor da II Copa Rio.

Lembrado, por Aimoré Moreira, Didi participou do sul-americano, de Lima. Os brasileiros foram vice-campeões, ficando o título com a seleção paraguaia dirigida por Fleitas Solich.

Em 1954, Zezé Moreira o chamou mais uma vez para defender o selecionado brasileiro. Na Suíça, após o Brasil ser eliminado pela Hungria (4 a 2), Didi era acusado de displicente e mercenário. Seus detratores diziam que ele só jogava no clube, onde ganhava elevada quantia.

Problemas particulares e a saída do Fluminense

Seus problemas pessoais passaram a interferir negativamente na sua vida profissional. O romance, por vezes, tumultuado com Guiomar, afetava seu rendimento em campo. Começaram os atritos entre Didi e o Fluminense. Depois de sumir quase duas semanas, a direção tricolor sentiu que Didi era um grande problema para o clube.

Em 1956, a diretoria do Botafogo, liderada por Renato Estelita, Ademar Bebiano e João Saldanha, partiu para a formação de um grande time. Didi era o jogador que o clube queria para iniciar uma nova era em General Severiano. O Fluminense dificultou de todas as maneiras à venda do craque, pedindo alto pelo passe e exigindo dinheiro vivo e à vista. As exigências foram atendidas e Didi, em abril de 1956, vestia a camisa botafoguense.

O primeiro título no Botafogo e a promessa cumprida

No dia em que assinou contrato com o Botafogo, Didi declarou:

 “Um dia em que o torcedor pensar em nós como seres humanos, saberá perdoar um erro ou outro. Diziam que eu não era de nada, que eu não gostava de jogar no Fluminense. Nada disso. Sempre tentei dar o máximo, mas os meus problemas particulares roubavam-me a calma e sem calma quem é que produz?”

O título de campeão carioca de 1957, primeiro conquistado com a camisa do Botafogo, foi exatamente numa final inesquecível contra o Fluminense. Depois dos 6 a 2, Didi cumpriu a promessa que fizera, caso conquistasse o campeonato, e caminhou do Maracanã até o seu apartamento no Edifício Guiomar, na Rua Coelho Neto, 41, em frente ao estádio do Fluminense, acompanhado por uma multidão de torcedores, para tristeza do meu amigo tricolor Sérgio Lago, que morava no mesmo prédio.

A “folha seca” leva o Brasil à Suécia


Terminado o Torneio Rio-São Paulo, em abril de 1958, com o Botafogo em 5o lugar, ao lado do Fluminense e atrás do Vasco, Flamengo, Corinthians e São Paulo, as atenções se voltavam para a Copa do Mundo.

Didi, naquele momento, expressava a sua vontade de ir à Suécia e depois jogar no futebol europeu. Disse, na oportunidade, que gostaria de vestir a camisa da seleção, porque seria a última vez. Estava esperando terminar o seu contrato com o Botafogo para ir jogar na Europa. Desejava, também, que a sua filha estudasse lá.  

Mais uma vez convocado, Didi disputou o lugar no time principal com o meia Moacir, que se saiu muito bem nos treinos. Ao questionarem sobre quem seria o titular, ele respondeu com a célebre frase: “Treino é treino, jogo é jogo”.

Didi carimbou o passaporte da seleção brasileira, nas eliminatórias para Copa de 58, ao marcar o famoso gol de “folha seca” contra o Peru, no Maracanã. O Brasil viajou para a Suécia, conquistou o mundial e Didi recebeu o título de melhor jogador do campeonato.

Rumo à Espanha

Notícias diziam que o Valência compraria o seu passe. Porém, quando o dirigente espanhol chegou ao Brasil, o interesse era por Joel ponta direita do Flamengo. A quantia para levar Didi era muito alta e o Valência desistiu.

Didi disputou o supersuper carioca de 58 e em 59, ano em que o seu sonho de jogar na Europa se realizou, disputou algumas partidas do campeonato carioca. No dia do embarque para Madri, encontrou-se com o Presidente Juscelino Kubitschek. Entrou-lhe a camisa 6, com que foi campeão do mundo, na Suécia, numa homenagem aos operários que construíram Brasília, inaugurada um ano depois.

No Real Madri, Didi encontrou um time de supercraques. Lá estavam o brasileiro Canário, ex-jogador do Olaria e do América, Puskas, da extraordinária seleção húngara de 54, Di Stéfano, o zagueiro uruguaio Santamaria, o francês Kopa e outros bons jogadores.

O conflito de vaidades entre Didi e Di Stéfano, argentino naturalizado espanhol e principal estrela do time, abreviou a permanência de Didi no futebol europeu. Sem ambiente no clube e com alguns problemas pessoais, desesperado, escrevia cartas para retornar ao ninho antigo.

O retorno ao Botafogo

Didi voltou a vestir a camisa do Botafogo, na noite de 28 de agosto de 1960, contra o Vasco. O Botafogo perdeu por 2 a 0 e a partir desse jogo iniciou uma série invicta de trinta e oito jogos até 17 de dezembro de 1961, quando foi derrotado pelo América por 2 a 1. O forte time alvinegro sagrou-se bicampeão estadual de 1961/62. 

Bicampeão mundial no Chile

Depois do título estadual de 61, vieram os preparativos para o Mundial do Chile. Aimoré Moreira, técnico que substituiu Vicente Feola, incluiu o nome de Didi na lista dos convocados. Agora, a disputa da posição era com o santista Mengálvio.

Com 34 anos, o veterano craque assumia o posto de titular da seleção e se sagrava bicampeão mundial. No vestiário, antes do jogo contra a Espanha, Nilton Santos calçava as chuteiras ao seu lado e ouviu Didi resmungar: “Vou mostrar aquele filho da puta como se joga futebol”, referindo-se a Di Stéfano que sem condições de jogar estava no banco espanhol. Nilton Santos virou-se e disse “não vai mostrar nada, vai jogar sério para nós não nos fudermos”. Didi não jogou uma grande partida, mas o Brasil venceu com a decisiva participação dos alvinegros Garrincha e Amarildo.

Novos rumos: Lima, Rio de Janeiro, São Paulo e a carreira de técnico

No segundo ano do bi estadual, Didi atuou em alguns jogos, porque seguiu para o Peru. O pensamento era, além de jogar no Sporting Cristal, iniciar a carreira de treinador. Dois anos depois, Didi estava novamente de volta ao Botafogo.

Em 65, foi para o México treinar o Vera Cruz. Voltou a jogar, em 66, no São Paulo. Vestiu a camisa tricolor em algumas partidas e sentiu que estava na hora de descalçar as chuteiras. 

A carreira de técnico de Didi teve momentos de glória. Nas eliminatórias da Copa de 70, classificou a seleção peruana ao empatar com a Argentina, em Buenos Aires; no México chegou as quartas de final, quando perdeu para a seleção brasileira por 4 a 2; dirigiu o Fluminense, na época da “máquina”; foi técnico do River Plate, da Argentina, barrando os medalhões e promovendo jovens valores; esteve no futebol árabe e na Turquia, onde, também, foi ídolo; em 1984 treinou o Botafogo e, também, dirigiu o Bangu.

Didi era um apaixonado pelo futebol, especialmente, pelo futebol arte que ele praticou em toda sua brilhante carreira. Pude sentir toda essa paixão quando conversamos, em sua casa, na Ilha do Governador.

Na presença do meu querido amigo e jornalista Marco Tinoco, que me levou ao encontro do “Mestre”, foram horas de boa conversa e aprendizado sobre o mundo mágico do futebol. Sua forma elegante de jogar levou o jornalista Nelson Rodrigues a chamá-lo de “Príncipe Etíope”. O craque também passou a ser conhecido por “Mister Futebol”.


Didi recebe o prêmio pelo título carioca de 1951 das mãos do Presidente do Fluminense Fábio Carneiro de Mendonça, tendo ao lado Benício Ferreira Filho.

Em 1952, no vestiário após a conquista da Taça Rio, Didi se enrola na bandeira do Fluminense.

Nos primeiros dias no Botafogo, Didi antes de um treino com Domício, Zezé Moreira e Rodrigues.

Em 1957, na goleada por 6 a 2 do Combinado Botafogo-Flamengo sobre o Honved, Didi marca de pênalti, deslocando o goleiro húngaro

Após a vitória por 6 a 2 diante do Fluminense, Didi e Guiomar iniciam a caminhada do Maracanã até às Laranjeiras. A promessa foi cumprida.

Didi e Guiomar mostram a faixa do título estadual de 1957.

Na vitória de 1 a 0 sobre o Peru, a "folha seca" de Didi carimbou o passaporte brasileiro para a Copa de 1958. O goleiro Asca apenas olha a bola na rede peruana.


Na vitória de 5 a 2 diante da França, a "folha seca" de Didi entrou no ângulo da meta de Abbes.

Didi entra em campo para enfrentar a Suécia, na final da Copa de 58. Aparecem Nilton Santos, Pelé, Vavá, Zito e Garrincha.

O "Mister Futebol", melhor jogador do mundial de 1958, recebe o cumprimento do Rei Gustavo, da Suécia.

No sul-americano extra de Buenos Aires, em 1959, o Brasil foi vice campeão invicto. No jogo diante do Uruguai, vencido pelos brasileiros por 3 a 1, a briga entre os jogadores foi generalizada. Didi aplicada uma voadora num adversário. Belini e Pelé também brigam.

No time de craques do Real Madri, Didi entre Di Stefano e Puskas.

Didi retorna ao Botafogo

Após a vitória sobre a Tchecoslováquia por 3 a 1, na final da Copa de 62, no Chile, Didi ouve o hino nacional brasileiro.

Bicampeão mundial, Didi ergue a Taça Jules Rimet.

Didi e Aymoré Moreira, no São Paulo, último clube do craque na sua carreira de jogador.

Jogadores e torcedores peruanos carregam Didi após a classificação para a Copa do Mundo de 70, no México.

Em 2000, Didi deixou a marca de seus pés na calçada da fama, no Maracanã.

"O Gênio da Folha Seca", o excelente livro do jornalista Péris Ribeiro, conta a vida de Didi.
 
Quando faleceu, Np dia 12 de maio de 2001, o corpo de Didi saiu da sede do Botafogo, em General Severiano, coberto pelas bandeiras do Botafogo e do Fluminense.

 

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